sexta-feira, 15 de agosto de 2014

GURPS ÆRTH - Capitulo 2

Na noite em que foram avisados de possíveis problemas na vila de Tsorvo, todos os Myrmidons foram às suas preparações de viagem. Ainda nesta noite, dois foram tentar interrogar o goblin preso para mais informações.

O primeiro era Marash-Do, conhecido pelos outros como "Olhos-Frios": um macho do Povo-Gato, já com uma certa idade, e quase sempre portando suas cimitarras gêmeas, seu manto pesado e seu olhar embotado. Sabe-se pouco mais sobre Olhos-Frios do que se encontra à vista: ágil, forte, guerreiro experiente, velho de alma morta. Vinha junto de Sodoma, o necromante. Sempre acompanhado de seu cachorro morto-vivo, um animal de estimação amaldiçoado, o feiticeiro da morte não é visto com bons olhos em Skyfall. Muitos perguntam-se porque um praticante da magia negra seria parte dos Myrmidons, e qual seria o tipo de chantagem ou dívida de favor que ele possui sobre Lord Carmell, a fim desse aceitar sua "presença desgraçada" em seu "nobre grupo de elite".

Juntos, caminharam até as masmorras. Lá estava o goblin preso, ainda a praguejar quando perguntado de alguma coisa. Parecia miserável preso, embora sem sinais graves de violência física. Sodoma, num passe de mágica, a garganta iluminada por dentro, falou na língua bárbara da criatura. Estabeleceu um diálogo que Olhos-Frios não entendia. Após algumas frases trocadas, Sodoma contou que a criatura afirmava não saber de nada sobre o ataque, e que os motivos eram banais: "vocês tem muito, nós temos pouco. Fomos pegar um pouco do seu muito", ele havia dito ao mago de vestes negras.

Olhos-Frios preferiu se certificar e entrou na cela do prisioneiro, buscando a intimidação. Ficou entre o goblin e a porta, abriu o manto mostrando as armas, dizendo que era bom que fossem ditas verdades ou a criatura pagaria em sangue... Infelizmente, a visão de suas armas não serviu como intimidação para o goblin, mas sim como oportunidade. Prontamente, ele pulou em direção à Olhos-Frios, segurando tanto seu cinto como o cabo de sua espada! Olhos-Frios golpeou com as garras em seu ombro, vertendo sangue, mas o inimigo saiu do agarrão portando uma das cimitarras do felino-homem. Sodoma, ao ver a cena, fechou e trancou a porta da cela, dizendo algo ao prisioneiro que Marash-Do não entendeu. Era uma proposta, vinda diretamente de seu asco pela fraqueza: "se você o matar, estará livre."

O goblin não precisava de incentivo melhor, e um combate iniciou-se. Um curto combate, na verdade, uma vez que Marash-Do sacou rapidamente sua espada restante, aparando com dificuldade a primeira estocada do inimigo. Mais dois golpes foram trocados, o som das espadas em choque reverberando nas rochas úmidas do calabouço, até que com um talho certeiro, o representante do Povo-Gato separou a mão da espada do goblin do resto de seu braço. Este, vencido, caiu ao chão em gritos e sangue. Sodoma, com o final do combate, destrancou novamente a cela, e forçando sua vontade mágica, os olhos da cabeça encolhida encrustada em seu bastão longo brilhando, sarou parte dos ferimentos do prisioneiro. Ele havia perdido a mão, é verdade, mas seu pulso estava completamente curado do corte.

Novamente perguntaram sobre o ataque. Sodoma disse que as respostas foram as mesmas, num tom mais desesperado: seu prisioneiro estava fraco, preso, malnutrido - e agora - mutilado. Olhos-Frios o prendeu no fundo de sua cela, numa armação de madeira em cruz, com os punhos e pernas acorrentados e separados. Ao sair, deu um lento e desdenhoso tapa em sua cara, quase um empurrão. 

Convencidos da aleatoriedade do assalto na estrada, partiram.

Fora das masmorras, com diferença apenas em ordem e sequencia, os Myrmidons organizavam-se para a viagem. Desta vez, ninguém de fora os acompanharia, nem mesmo os jovens Nord e Jay - quem seria a responsável por dirigir a carroça e cuidar dos animais era a amazona Belly Swan, também parte do grupo. Belíssima, sua aparência talvez fosse por si só razão da sua permanência no grupo, mas ela também tinha habilidade com a besta e no trato de animais, além de cavalgar melhor do que o melhor cavaleiro de Skyfall.

Tudo pronto, e todos os membros foram em comitiva. Sodoma, Olhos-Frios, Luparus, Damon Cook e Belly Swan na carroça, enquanto Hochsend, Hagen e Siltari Taure foram à cavalo. A ælfa Siltari Taure, uma das poucas de sua raça em Skyfall, foi como a batedora do grupo desta vez. Além de elo de ligação com os ælfos de Eldenurim, região próxima à Norrland, Siltari é, de longe, a melhor arqueira do Norte - talvez de todos os Nove Territórios.

A viagem a Tsorvo então começou, com a duração prevista de meio dia de cavalgada. Em direção à problemas, provavelmente. No caminho, poucas conversas; Belly mostrou-se interessada em seus companheiros, e se tornou um pequeno poço de disputas pela sua feminilidade. Olhos-Frios tentou acompanhar Siltari na vanguarda do grupo, mas logo retornou alegando um mal estar, e pareceu cochilar na carroça logo depois.

E, de fato, encontraram problemas antes do final da viagem. Quase que no mesmo local do ataque dos goblins no dia anterior, poucas horas fora de Skyfall, Siltari notou vultos escondidos nos morros que cercam a Estrada do Rei. Ao mesmo tempo, algo se arrepiou na nuca de Belly, e ela também percebeu o perigo... logo avisou a todos, da maneira mais furtiva que pode.

Siltari avistou uma sombra ao longe, apenas uma sugestão de presença, dezenas de metros à frente e acima, entre a folhagem da colina baixa. Era difícil até mesmo de distinguir, mas ela arriscou atirar uma flecha no local. E como onde Siltari Taure enxerga, Siltari Taure acerta, a trajetória de sua seta terminou em um grito abafado ao longe. Inadvertidamente, o inimigo caído, guinchando, tornou-se o sinal de ataque dos que esperavam: como no dia anterior, mais de duas dezenas de goblins tribais armados desceram da colina, buscando atacar a caravana!

No entanto, encontraram os aventureiros um pouco mais preparados. Diferentemente do dia anterior, estavam com o grupo completo e tiveram algum aviso. Hochsend bradou ordens de combate, pedindo que Belly acelerasse à carroça e fugisse do combate - e então partiu com seu cavalo, esperando que alguém o seguisse. Damon Cook concentrou-se por um segundo, seus olhos brilhando como um caleidoscópio, e então fez a ilusão de uma trincheira aparecer, entre a carroça e o grupo de inimigos. Era funda, com estacas sangrentas no fundo, e esqueletos de goblins mortos feito espetos.

Siltari permaneceu à frente do grupo, fazendo inimigos caírem flecha após flecha disparada. Luparus pediu que parassem, saltou da carroça com agilidade, sacou uma de suas bombas de fumaça escondidas, e seguiu o veículo à pé, ficando na retaguarda. Sodoma, após reclamar da indecisão de Belly, ora acelerando ora freando a carroça, decidiu também por descer do veículo, sumindo inexplicavelmente, após magicamente tornar-se invisível. Mandou seu cão zumbi atacar os inimigos, enquanto desaparecia. O cão, sem expressão, começou a correr.

As criaturas atacavam com lanças e flechas, mas entre ataques que erravam por pouco ou defesas bem sucedidas, ninguém fora ferido. A maioria dos goblins parou beirando ao que julgaram ser uma trincheira real, e ficaram em formação de combate: rosnavam e xingavam em fila, suas lanças apontadas à frente. Finalmente freando a carroça, Belly retirou furtivamente do braço uma pulseira com um pendente de cavalo e a arremessou ao chão; o pendente transformou-se instantaneamente, com pequena explosão de luz e fumaça, em um grande cavalo de batalha de pelagem negra. Era forte e musculoso, com a crina e rabo como ouro líquido e olhos brancos como a lua cheia. Era Sarossu, sua montaria e companheiro mágico. O cavalo correu em um arco, a fim de encontrar-se de frente a linha de goblins parados, atropelando-os da esquerda para a direita. Olhos-Frios, aparentemente sem medo de morrer, saltou de modo a encontrar o meio da primeira fila de inimigos, aparando golpes de lança com habilidade enquanto pousava. No segundo seguinte fez um giro completo portando suas duas cimitarras, atingindo quatro inimigos, cortando troncos e membros num redemoinho de sangue. Na outra extremidade da linha, Hochsend veio cavalgando, bloqueou projéteis com seu pesado escudo anão e acertou inimigos de cima do cavalo como fossem pregos à ser afundados na madeira mole. Tencionava encontrar Sarossu de frente, esmagando a hoste improvisada como um martelo e bigorna. Parecia funcionar.

Sodoma, caminhando invisível, checou o campo de batalha e viu como seus companheiros estavam: viu Siltari Taure começando a ficar cercada, os goblins correndo em sua direção mais rápido do que ela podia acertar com as flechas, ou atrapalhando sua mira forçando-a se esquivar das armas arremessadas; alguns já assomavam-se em suas costas. Viu Belly parando a carroça, com Luparus às suas costas, protetor. Damon Cook continuava dentro do veículo, também analisando o combate pelas frestas das cortinas e lançando um outro feitiço - o "cozinheiro" olhou de maneira alucinada para um lugar não específico do campo de batalha, e o ar daquele local pareceu vibrar, como ondas de calor que formam as miragens do deserto. Essas vibrações transparentes, porém visíveis, começaram a puxar todos ao redor para si; o que de certa forma ajudou os avanços de Hochsend e Sarossu, enquanto impedia a fuga dos inimigos. Era como se tivesse aberto um ralo na realidade, que era sugada lentamente. Também viu seu cachorro desmorto levando um tribal que corria ao chão, comendo-lhe a barriga da perna. O animal não fazia um som. O goblin gritava em desespero.

Sodoma então preferiu então concentrar-se em um feitiço de ataque, um disparo de luz solar no meio da falange inimiga, já combalida pelos ataques de Sarossu, Hochsend e Olhos-Frios. Mirou displicentemente o meio do grupo e lançou o feitiço, seus dedos invisíveis crepitando. O próprio jato de luz tornou-se visível somente ao deixar sua posse. Num azar tremendo, o disparo mágico passou alto por sobre a cabeça dos goblins, atingiu Hochsend na virilha, na junção de seu corpo com seu cavalo. Mesmo sem empregar toda a força da sua magia atrás do raio solar, o golpe era para matar, e queimou gravemente o corpo do cavaleiro, que - em meio à seu ataque de carga - caiu duramente de seu cavalo, com sua genitália em chamas!

Os goblins continuavam a ser puxados para o ponto de concentração de Damon, empurrados por um flanco por Sarossu, que empinava alto, os pisoteando. Seus cascos pareciam em chamas. Olhos-Frios girou suas espadas mais um par de vezes, saltando para longe da formação goblin, já em total colapso. Alguém acertara seu companheiro, e ele não vira quem ou como. Belly sacou sua besta e atirou em um goblin da formação, sua seta enterrando-se no chão, errando o alvo. Luparus continuava na retaguarda, estudando a todos, preferindo afastar-se do combate, ainda segurando sua bomba de fumaça. Ao longe, Siltari deu um giro gracioso no ar, desmontando e desviando de uma lança arremessada ao mesmo tempo, e pousou levemente no chão. Em momentos estava cercada. Abaixou-se, como se pegasse impulso para saltar, e saiu voando como um pássaro, os inimigos olhando em espanto ela longe do alcance das suas facas. 

Hochsend foi arrastado junto dos tribais por um momento enquanto recuperava os sentidos. Postou-se de joelhos com dificuldade, bradando "TYR! Empreste-me sua força!" Em um piscar de olhos, seus ferimentos vazaram luzes e desvaneceram. Parecia renovado, determinado.

E o combate continua...